Sim, não sobrou paciência/tempo/inspiração para delongar
individualmente sobre todas as experiências. O faço agora. Fui editando os
vídeos, mas faltava um tempero. Resolvi juntar tudo e fazer uma edição um pouco
mais empolgada. Empolgação, sim, é uma boa rota para embasar as Lições de um
Miata.
(Full HD)
Conversamos. Deliciosamente. No Velopark, apenas uma semana
com o carro, primeiro contato decente com um tração traseira, discutimos. Em Curitiba,
amadurecemos nossa relação. Em Jacarepaguá, finalmente conectamos. Bah, e como.
Curitiba (PR):
(foto: Gustavo Preiss)
Começo pelos deslocamentos periféricos e necessários ao dia
de pista. A viagem, sim. Não sou talentoso o suficiente para conseguir
descrever fielmente o prazer de viajar em uma serra encrustada na mata, densa e
muito verde, onde se alterna entre o calor do sol e o choque com os húmidos, aromáticos
e gelados lances de sombras, a bordo de um conversível. Leve, ágil. Contido,
mas que canta nos momentos de euforia apenas no tom certo. Tom denso, dado pelo
motor agudo, sempre disposto como todo bom japonês a girar, com baixa inércia,
que clama por um punta-tacco a cada curva que começa a ser tangenciada, e lhe
cumprimenta por isso. A direção não precisa ser drive-by-wire para não passar
demasiadamente as imperfeições do solo ou o fazer brigar em irregularidades (obrigado
braço-a-terra zero e pneus finos), e mesmo assim ser extremamente comunicativa.
A suspensão é mais confortável que a de um Ford Focus primeira geração
(referência em compromisso conforto/esportividade), as molas não precisam ser
duras porque o centro de gravidade é extremamente baixo, enquanto a calibração
dos amortecedores é na medida e os bancos de couro muito ergonômicos e
confortáveis. Some a isso algo vintage,
carnudos pneus aro 14, e simplesmente dirija, despreocupado, confortável, sem
estresse, com um mundo de ângulo de deriva a explorar. O câmbio, com
posicionamento perfeito, engates deliciosos e relação feita à imagem e semelhança
da estrada a sua frente, simplesmente casa. Sim, eu também caso sem pestanejar.
Agora à outra parte da diversão, a pista.
“Understeer, it`s the sound of disappointment” /
“Subesterço, é o som do desapontamento”, frase de Jeremy Clarkson. Concordo, pois
sempre quis dizer para mim: engula seu orgulho! Mate velocidade, tire o pé,
traga de volta à linha; esqueça meu amigo. Mas não, agora dá também ás vezes
para pisar, consertar, e correr para o abraço ! Haha. Muito bom, muito bom,
está ficando legal.
Equilíbrio, neutralidade, “50/50”, baixo momento polar de
inércia. “O Miata é um carro equilibrado”. A citação é por minha conta, a fonte
podia ser qualquer sítio de informação do carro. Mas o que quer dizer isso?
Sim. Agora deu para entender. A proximidade entre o subesterço e o sobreesterço
é minúscula! Escolha e terás. Com jeitinho, na conversa, de acordo com sua
preferência, dá para passar de um para o outro. Entrou muito rápido com uma
tomada de curva que lhe causa subesterço ? Não será aquele enorme
desapontamento não, será sutil, converse que não vai durar muito e abrirá
espaço para comportamentos mais nobres.
Sim, para o nobre e elegante sobreesterço. Isso nos leva a
Jacarepaguá.
Jacarepaguá (RJ):
(foto: Bernardo Jacob)
Normalmente preciso ver os vídeos para entender o que
aconteceu. Sim, acho que é isso que é um carro comunicativo e fácil de guiar. Primeira
e última vez do Miata nesta belíssima pista. Aliás, a pista. Quando vamos dar
valor à qualidade de vida, aos detalhes? Lugar lindo, carregado de emoções,
prazerosíssimo de se estar, que supria um hobby que tem seu espaço na
sociedade. Ou não? Pois é. Brasileiro, genericamente, não gosta de carro. Acho.
Pode talvez gostar da sua funcionalidade, a mobilidade, mas não vê prazer na
experiência, nos detalhes da máquina. Pois é, coletivamente ainda não chegamos
neste nível de finesse.
Ao carro. São 128 cavalos americanos do Japão, e não
faltaram lições de outrem de que seria pouca potência para fazer o Miata
performático. Mas, faltavam as lições do Miata, sim! Busque saturar os pneus traseiros
apenas com a carga lateral, depois dê o golpe fatal, a pincelada longitudinal
através do diferencial Torsen com o pequeno motor. Sensacional. Agora, também
entre na curva um pouco mais rápido do que deveria, faça uma tomada um pouco
mais tarde, suave, traga a deriva dos pneus dianteiros no seu pico de força
lateral, quando necessário use um pouco a inércia a seu favor, e você terá um
longo e performático drift. Trail-braking a gosto, embora uma pitada
seja recomendada.
Replicável no Velocittà ? Não o conheço, veremos.
Velocittà (SP):
(foto: Arq. Pessoal)
A novidade do ano surgiu relativamente do nada e ficou em um
abre, não abre, fica restrito, não fica. Surgiu a oportunidade e não dava para
perder, o médio-longo prazo não parecia tão animador (previsão que acabou se
concretizando). Uma curva me pareceu perigosa, com área de escape em descida.
Fora isso, ótima pista de média, com a fundamental presença de pontos que
precisam daquela dedicação especial, e lhe fazem querer voltar novamente e
fazer melhor. É bonita, grande, tortuosa, tem sobe, tem desce e é bem feita. Não
sei se faltou alguma coisa, mas acho que me faltam mais emoções por lá para
bater uma paixão.
Um carro desafiador e recompensador. Então é isso. Ainda não
é de primeira, tem que ir sentido, mas eventualmente foi. Novamente, saturar os
pneus traseiros só no motor não dá, aqui não, aqui você precisa se dedicar um
pouco mais. Obrigado!! Dê generosa dose de carga lateral. Uau. Acho que a
receita não conseguiu efetividade apenas em 2 ou 3 curvas. E não precisa estar
com o motor no seu ponto doce não, baixas 3.000-4.000 rotações já fazem o
serviço em alguns lugares. Lugares quando a pista lhe entrega gradientes
favoráveis são perfeitos. Sim, aí é melhor falar disso em Capuava.
Capuava (SP):
(foto: Eduardo Santello)
O encerramento da série, por hora ao menos. Pode ser um
pouco estreita, curta e com poucos pontos de ultrapassagem, o que dificulta a
disputa de posições. Quem diabos vai fazer isso lá ? Não, não é a proposta
dela. Então concluímos que esses pormenores são irrelevantes.
Viva o dinheiro. Em minha opinião a mais elegante e
inebriante experiência de pista do Brasil. Como sempre: os detalhes. O caminho à
pista, a aconchegante infraestrutura, o esmero e bom gosto na construção e
manutenção da pista, o traçado rebolante e desafiador, os gradientes a torto e
direito, a geografia paradisíaca, aquilo parece .. sei lá.. um resort. Hmm,
sim, um resort gearhead. Gosto
bastante da proposta. O Miata também gosta, assim me pareceu.
O Miata. Ele faz o que você pedir, claro que precisa pedir
com polidez e respeito. Pode ser “dianteiro”, “traseiro”, neutro, depende do
que você quer. Bom. Está velho, mas não está carrancudo, é bastante flexível a
diferentes idéias. Mas devo confessar que ele se apega com mais paixão a idéia
de ser traseiro. Não vou reclamar.
Quando a curva é lenta e muito fechada, encaro mas não gosto
muito não. Não é muito natural ou fluído. Minha receita que não dá certo é
forçar, precisa ser natural. Mas vá lá. Miata dá um jeito, apesar de também
concordar comigo. Dá, mas com cuidado. Baixo momento polar de inércia é a
preocupação em manter a massa do carro o mais longe possível dos extremos. Some
isto com entre-eixos curto, quatro rodas, e você tem um pequeno pacote dinâmico
que muda de direção muito facilmente e talvez rápido até demais em baixas
velocidades. Então a receita é antecipação. Não é carro de drift, o ângulo de
esterço máximo das rodas é pequeno, então simplesmente não da para corrigir se
passar do ponto. Ponto, que ponto? Ainda bem que não estamos na rua.
Não puxo o freio de mão. Cadê a elegância, a suavidade nisto?
Soa como apelação e me é feio, então não. Muito menos chutes na embreagem,
caramba, horrendo, cadê o respeito à mecânica, ao carro? Agora vir no limiar do limite, usar a
quantidade de movimento, transferir cargas, conversar dinamicamente, esse sim
me parece um bom programa. Aprender a ler os detalhes. E ele ensina, ele
conversa.
Assim como ponderadamente deliciar um bom vinho ou cerveja,
encontra-se o desafio de ler as nuances, interpretar as notas, o que invariavelmente
requer as respectivas horas de vôo. Você não consegue decidir se o melhor é a
estrada ou chegar ao destino. Se são o mundo de sensações proporcionadas ao
longo do aprendizado ou o domínio cada vez maior (porém nunca pleno) dos detalhes
daquela experiência. Não sei. Isso felizmente significa que tenho que andar
mais um pouco para descobrir. Perfeito.